Monday, April 20, 2009

A construção de sentido na informação das histórias em quadrinhos



The construction of meaning in information within comics
por Robson Santos Costa  Evelyn Goyannes Dill Orrico


Resumo: Discute a construção de sentido na linguagem das histórias em quadrinhos compreendendo-a como um meio facilitador de transmissão informacional, fazendo um breve relato de como a área da Ciência da Informação trabalha com a informação nas mais diversas formas de linguagem, especialmente as específicas da contemporaneidade. Partindo das concepções de enunciado e gênero secundário contemporâneo, segundo as orientações de Bakhtin para quem os gêneros discursivos são construções sociais, este trabalho examina o conceito de histórias em quadrinhos e as especificidades da sua linguagem com vistas a inseri-las no processo de transmissão de informações. Por fim, analisa o processo de construção de sentido - e da informação - na linguagem e como a informação é ali produzida. A conclusão é de que as histórias em quadrinhos constroem sentido e produzem informação de forma singular, já que fazem uso de linguagens, signos e demais elementos que compõem essa forma de gênero discursivo .

Palavras-chave:  Histórias em quadrinhos; Linguagem; Construção de sentido; Informação; Gêneros discursivos, Memória de gênero.

 

 

Abstract:  This paper discusses the construction of meaning in the language of comics, viewing it as a facilitator for the transmission of information. It also offers a brief account of how the area of Information Science deals with information in the various forms of language, especially those specific to contemporary times. Starting from the conception of utterance and of secondary contemporary genre, and based on Barkhtin's notion that discoursive genres are social constructions, this paper examines the concept of comics and the specificities of their language with a view to fitting them into the process of the transmission of information. It finally analyzes the process of the construction of meaning – and of information – in language, as well as the way information is generated there. Our conclusion is that comics generate meaning and construct information in a unique way, since they use languages, signs and other elements specific to that type of discoursive genre.
Key words: Comics; Language; Construction of meaning; Information; Discoursive genres; Genre memory.


                                                                                       

 

 

 

Introdução
A área de conhecimento científico Ciência da Informação (CI) surgiu em meio ao “boom” informacional ocorrido em finais da Segunda Guerra Mundial, voltada à pesquisa sobre informação nos mais diferentes contextos sociais. O interesse de área destinava-se sobretudo a refletir sobre demandas informacionais no campo da ciência e tecnologia.

O artigo – hoje histórico - do cientista Vannevar Bush publicado em 1945 foi um dos primeiros textos a versar acerca da Ciência da Informação , podendo ser considerado atualmente como um dos textos de origem desse campo de estudo (Saracevic, 1996, p. 42). Nele Bush pretendia tornar mais acessível um acervo crescente de conhecimento identificando o problema da explosão informacional e o papel das tecnologias de informação como um meio de possível solução. Outros trabalhos como o de Wersig & Nevelling de 1975 (apud Saracevic, 1996, p. 43) trataram dos aspectos históricos da Ciência da Informação  enfatizando sua natureza e relevância social na transmissão de conhecimento no mundo contemporâneo.

Saracevic (1995) recorda que “a explosão da informação é um problema social que teve seu início com o desenvolvimento das ciências, e hoje estende-se para todas as atividades humanas”. Desse modo, a Ciência da Informação é vista como um campo de conhecimento interdisciplinar de importância estratégica não somente no âmbito da ciência mas – principalmente nos dias atuais – nas mais diversas esferas que englobam o contexto social contemporâneo.

Um dos pressupostos que norteiam esta análise é o de que a Ciência da Informação , admitindo a interdisciplinaridade da área, e para resolver os diversos problemas que a informação demanda, estabelece diálogo com diversas áreas do conhecimento, como por exemplo a Psicologia Social, a Computação, a Biblioteconomia, e especialmente com os estudos da linguagem.

Outro pressuposto a nortear este artigo é o de que o ser humano se constitui discursivamente e para tal a linguagem é elemento fundamental. É pela linguagem que os grupos humanos constroem os contextos sociais, estabelecendo relações afetivas, comerciais, informacionais. Podemos dizer que independente do contexto social ao qual esteja ligada, todo e qualquer tipo de informação pertence a uma determinada linguagem que pode ser compreendida como o meio pelo qual as culturas humanas constroem narrativas e discursos que orientam suas ações (Ferreira; Orrico, 2002, p. 8).

Além da informação técnico e científica – nos mais variados suportes – o campo de estudo da Ciência da Informação abarca uma gama variada de linguagens que pode ir da fotográfica e cinematográfica até, por exemplo, a quadrinística.

Desse modo, acreditamos ser de grande importância compreender como ocorre o fenômeno informacional em determinadas linguagens e como se dá a criação de sentido em linguagens específicas, uma vez que “a função e a natureza da informação comportam um elemento de sentido, uma produção de significado transmitida por meio de um sistema de signos (a linguagem) a um ser consciente (o indívíduo) por meio de uma inscrição (a mensagem) (Castro, 2005).


Portanto, compreender como ocorre a construção de sentido nas mais variadas linguagens depende de compreender a construção informacional nos mais diferentes suportes e linguagens que compõem nosso cotidiano. Além de compreender esse processo de construção, é preciso bem determinar a categoria de documento e os centros de informação e bibliotecas em que estão inseridos, visando a uma maior eficiência tanto na descrição quanto na recuperação da informação. Assim este artigo volta-se para uma maior compreensão da linguagem das histórias em quadrinhos visando um maior entendimento de como ocorre o processo de construção de sentido nessa linguagem singular tomando-o como um meio facilitador de transmissão informacional.

As histórias em quadrinhos
Uma das manifestações discursivas da cultura contemporânea são as histórias em quadrinhos (HQs). Assim sendo, pretendemos realizar uma breve apresentação da linguagem das histórias em quadrinhos e suas especificidades na construção de sentido e posterior produção informacional.

As histórias em quadrinhos, como linguagem, existem, no entendimento de alguns pesquisadores como Moya (1977), desde as inscrições imagéticas produzidas pelo homem primitivo em paredes de cavernas ancestrais. Vergueiro (1998, p. 24) enfatiza que “é possível falar de vários começos, em vários iniciadores distribuídos em diversas partes do mundo”. É fato, porém, que a linguagem das histórias em quadrinhos se consolidou em todo o mundo como a conhecemos hoje como um produto oriundo da indústria cultural de massa em tendo seu surgimento creditado posteriormente, por convenção, às últimas décadas do século XIX em especial na imprensa norte-americana.

Deixemos de lado a rica história das histórias em quadrinhos, e passemos a discutir como essa linguagem singular produz sentido e informação. Para que tal ocorra, em trabalho anterior (Costa, 2007), compreendemos as histórias em quadrinhos como um gênero discursivo secundário no sentido bakhtiniano. A concepção de gênero discursivo aqui adotada foi apresentada por Bakhtin, pensador russo do inicio do século XX, que atestou que, devido à grande quantidade de discursos produzidos nas mais diversas esferas sociais, existiram umas formas reconhecíveis que permitiriam o estabelecimento da comunicação entre seus membros. Essas formas reconhecíveis constituir-se-iam de formas estabelecidas antes de um determinado evento de comunicação e, por via de conseqüência, estariam presentes nos enunciados futuros.

Primeiramente devemos enfatizar que os gêneros – compostos por enunciados sócio-historicamente situados - devem ser compreendidos como intrinsecamente ligados à atividade humana e as mais diversas situações sociais (Rodrigues, 2005, p. 165). Podem surgir novos gêneros enquanto outros podem “desaparecer” de acordo com as mais diversas complexidades sociais.

Bakhtin, ao descrever os gêneros, dividiu-os em duas categorias distintas: gêneros primários (simples) e gêneros secundários (complexos). Bakhtin (1997) compreendia os gêneros primários como os gêneros simples do discurso, visto que se apresentam em situações de comunicação mais “simples” e diretamente ligadas ao cotidiano social. Seriam as conversas entre sujeitos no dia-a-dia, as cartas, diários, bilhetes, etc. Os gêneros secundários seriam “complexos”, pois “aparecem em circunstâncias de uma comunicação cultural mais complexa e relativamente mais evoluída” (Bakhtin, 1997, P. 281). Nesse contexto pertenceriam os discursos teatrais, literários, científicos, políticos e ideológicos.

Uma das principais características dos gêneros secundários é a agregação de um ou mais gêneros primários em sua produção. A partir de sua incorporação ao gênero secundário, o gênero primário sofre um processo que o modifica fazendo-o perder “sua relação imediata com a realidade existente e com a realidade dos enunciados alheios” (Bakhtin, 1997). Bakhtin cita como exemplo a inclusão de um gênero primário, como o diálogo cotidiano em uma narrativa romanesca e afirma que, a partir dessa inclusão, esse gênero primário passa a fazer parte da realidade do gênero secundário do romance literário.

Compreenderemos as histórias em quadrinhos, HQs neste artigo como um gênero secundário complexo e contemporâneo do discurso visto que são uma manifestação social surgida em condições sociais de produção específicas. A importância de entendermos as histórias em quadrinhos, HQs como um gênero discursivo secundário transcende a ação classificatória; compreendemos que as, histórias em quadrinhos, HQs se constroem em situações de práticas sociais complexas, demandando que os seus leitores possuam certo conhecimento prévio desse gênero para bem conseguir lê-las.

Os gêneros, segundo Bakhtin (1997), constituem-se de enunciados que, a seu turno, surgem de enunciados anteriores e produzidos por falantes imersos em situações sócio-históricas, não sendo, portanto, fruto do que ele denomina de “Adão mítico” , personagem que teria proferido o primeiro enunciado. Todo enunciado – pertencente a um gênero - é único, jamais se repete pois é proferido em condições de interação social específicas. Por outro lado todo enunciado somente é produzido por meio de enunciados anteriores que são retomados a cada nova enunciação. Cada enunciado produzido geraria ainda uma atitude responsiva ativa, ou seja, “enunciados-respostas” que gerarão novos enunciados e assim sucessivamente.

Essa compreensão dos enunciados seria semelhante ao que Orlandi (2005, p. 31) compreende como uma memória discursiva, que seria “o saber que torna possível todo dizer e que retorna sob a forma do pré-construído, o já dito que está na base do dizível, sustentando cada tomada de palavra”.
Desse modo, todo gênero discursivo possuiria uma memória de gênero de que se utiliza como base e que é retomada na produção de seus enunciados. Essa memória de gênero é essencial para produção de enunciados pertencentes a determinado gênero discursivo haja vista que seria impossível a produção de enunciados de “lugar-nenhum” no interior de um contexto social, pois “se os gêneros do discurso não existissem e nós não os dominássemos, se tivéssemos que criá-los pela primeira vez no processo do discurso, de construir livremente e pela primeira vez cada enunciado, a comunicação discursiva seria quase impossível” (Bakhtin apud Clot, p. 224) e, diríamos nós, o processo informacional não se constituiria.

Memória de Gênero e informação
O conceito de informação pode ter diversas definições. Etimologicamente o termo informação é proveniente do verbo latino “informare” que significa colocar em forma, criar, representar ou construir uma idéia ou uma noção de algo podendo ser compreendida como processo de atribuição de sentido (Araújo, 2001, p. 1). Alguns autores como Little John ([197-], p. 152) associam o conceito de informação à idéia de redução de incerteza  ou entropia visto que quanto maior o grau de incerteza maior será o grau de informação. Se não houver incerteza não haverá informação visto que nada de novo será agregado. Barreto (1994, p. 3) qualifica informação “como um instrumento modificador da consciência do homem e de seu grupo”, sendo que, quando assimilada de forma adequada, “produz conhecimento, modifica o estoque mental de informações do indivíduo e traz benefícios ao seu desenvolvimento e ao desenvolvimento da sociedade”.

Poder-se-ia aproximar o processo de formação da memória de gênero ao que se passa no processo informacional, na medida em que, se a informação transforma estrutura, segundo Belkin (1990), é preciso, então, considerar que ela interfere sobre um processo basal já apreendido anteriormente.
Essa relação gênero/memória de gênero pode ser compreendida como um elemento facilitador e de grande importância na construção de sentido visto ser este um elemento da própria natureza do fenômeno informacional. O enunciado, ao ser proferido em determinado gênero discursivo, será parte das especificidades que compõem esse gênero e sua base memorialística. Dessa forma, ao ser proferido no interior do gênero ao qual pertence a relação deste com sua memória de gênero será um meio que facilitará a compreensão da informação transmitida pelo sujeito inserido no processo informacional.

Porém, a cada enunciado – ou discurso – podem pertencer as mais variadas linguagens constitutivas dos mais diversos gêneros discursivos e que influem na produção de sentido desse enunciado.

A Linguagem quadrinística
As histórias em quadrinhos como linguagem podem existir de acordo com diferentes pontos de vista desde a antiguidade mas trataremos dela como uma linguagem ligada à contemporaneidade sendo desenvolvida e difundida em todo o mundo em especial a partir do século XX.

A linguagem das histórias em quadrinhos pode se apresentar em variadas formas: das mais simples às mais complexas. Porém, poderíamos dizer que no momento em que um sujeito tem contato com a linguagem dos quadrinhos, seja em uma revista, uma tira de jornal ou qualquer outro meio, é a união de sistemas de linguagem diferentes – cada uma com suas regências específicas – que primeiramente chama sua atenção: a imagética, reunindo as noções de perspectiva, simetria, hachuras, pinceladas, tonalidades, contornos, cores, etc. E a textual, que engloba a gramática, a sintaxe, sistemas morfológicos e outros. Para Eisner (2001, p. 8), a leitura que um indivíduo faz de uma história em quadrinhos “é um ato de percepção estética e de esforço intelectual”.

Nessa união de signos, porém, é provável que o que mais se sobressaia para o sujeito seja a imagem. Inclusive podem existir narrativas quadrinísticas sem texto, apenas imagéticas. Barthes (1990, p. 30) recorda que para um indivíduo “reconhecer” uma imagem é necessário que exista um já dado “saber-cultural” pelo sujeito, uma espécie de memória-imagética embora isso possa ocorrer em níveis de complexidade bastante variados.

No caso das histórias em quadrinhos que reúnem sistemas sígnicos imagéticos e textuais, Barthes (1990, p. 33-34) utiliza um conceito denominado de função de relais em que “a palavra e a imagem têm uma relação de complementaridade; as palavras são, então, fragmento de um sintagma mais geral, assim como as imagens, e a utilidade da mensagem é feita em um nível superior: o da história, o da anedota, o da diegese”.

No interior da narrativa a união desses sistemas sígnicos muitas vezes pode gerar um fator de redundância na relação texto e imagem uma vez que o texto pode descrever exageradamente algo que a imagem já significa. Por outro lado, dependendo do que a narrativa pede, muitas vezes a relação texto e imagem pode – e deve – possuir significados diferenciados. Um exemplo se dá quando o narrador descreve um acontecimento e a imagem nos mostra outro, ou seja, dois acontecimentos construídos concomitantemente por linguagens diferentes, em uma mesma narrativa. O cinema também pode usar esse artifício, já no caso da literatura não seria possível, visto que se utiliza preferencialmente de uma linguagem, a verbal.

No entanto, a linguagem quadrinística não se resume apenas à união desses dois sistemas de signos. Diversos outros elementos podem ser utilizados das mais diversas formas no interior dessa linguagem com a pretensão de auxiliar a narração de fatos e acontecimentos. Talvez um dos mais conhecidos sejam os “balões”, oriundos dos filactérios egípcios e que possuem a função de recipiente que contém em seu interior imagens ou palavras que podem servir como pensamentos ou diálogos de personagens da narrativa.

Para a representação da emissão de sons há a utilização das onomatopéias, também utilizadas na linguagem literária. Em determinadas línguas, as onomatopéias não utilizam termos que se aproximem de sons mas palavras cujo significado pode remeter a determinado som como, por exemplo, a língua inglesa que utiliza termos como crack ou crash com o propósito de representar o som de batidas e, ou colisões.

Além dos balões e das onomatopéias, Eisner (2001) aponta outros elementos de grande importância em uma narrativa :

a) rabinho - que é o indicador que parte do balão para o personagem;
b) o quadrinho e o requadro - são, respectivamente, o quadro que contém uma determinada cena (box frame) e o seu contorno;
c) as calhas - o espaço entre os quadrinhos;
d) as tiras - que são uma fila de quadrinhos (da esquerda para direita) na página.

Cada um desses elementos também possui particularidades próprias que influenciam o sentido de uma narrativa. Como exemplo podemos citar os requadros que, de acordo com o contorno, modificam o sentido da mensagem em relação ao tempo. Um requadro com contorno reto (Ilustração 1) significa que a narrativa ocorre em tempo presente. Já um requadro com contorno ondulado pode significar situações ocorridas em tempo passado ou em sonhos (Ilustração 2). O mesmo ocorre aos balões visto que, dependendo do contorno, as palavras ou imagens em seu interior podem representar diálogos, pensamentos, sonhos, etc.


 Fonte: Eisner (2001, p. 51) Fonte: Eisner (2001, p. 51)

O formato das palavras inserido nos balões também possui suas especificidades. Palavras em negrito ou em tamanho maior que as demais podem representar uma fala mais alta ou um grito (Eisner, 2001, p. 149). Desse modo “as palavras sofreram um tratamento plástico; passaram a ser desenhadas; o tamanho, a cor, a forma, a espessura, etc, tornaram-se elementos importantes para o texto... Dois sentidos diversos são dados pela mesma palavra através de tratamentos formais diferentes” (Klawa; Cohen 1977, p. 112-113). A especificidade principal da linguagem quadrinística não se resume a nenhum dos elementos apresentados até então. A relação texto/imagem não é primordial visto que podem existir histórias em quadrinhos apenas com imagens. Os demais elementos como os balões podem ou não ser utilizadas na narrativa.

Sendo assim, podemos dizer que essencialmente a especificidade da linguagem “reside, antes, no modo narrativo visual capaz de agenciar elipses gráficas e espaciais. O desencadeamento de imagens (“congeladas” no tempo e no espaço) será sempre relacional” (Cirne, 2000, p. 29) a que denominamos corte gráfico. O leitor é quem constrói mentalmente o movimento, o timing da ação, o tempo e o espaço em que a narrativa ocorre. Como relata Cirne (2000, p. 137), “sem cortes, não teríamos quadrinhos, simplesmente”.

Ou seja, a seqüência de imagens criadora de sentido em seu conjunto é que define uma história em quadrinhos como tal, por esse motivo, essa forma narrativa também é conhecida pelo termo de arte seqüencial. A leitura de uma narrativa geralmente ocorre, principalmente no ocidente,  no sentido da esquerda para direita e de cima para baixo dentro do limite espacial de uma página.




   Fonte: Eisner (2001, p.41)



McCloud (2005, p.7-9), acredita que o termo arte seqüencial, embora possa designar as histórias em quadrinhos de um modo genérico, deixaria alguns pontos falhos. A palavra arte seria um critério de valor enquanto que outras formas simbólicas também podem ser seqüenciais, além disso, o termo arte seqüencial nada diz sobre ser algo imagético ou não. E mesmo o termo imagem também não seria muito preciso uma vez que a palavra escrita em um suporte também seria uma imagem seqüencial. E como o espaço é para os quadrinhos o que o tempo é para o cinema, as imagens não ocupariam o mesmo espaço em sua seqüência, mas justapostas. McCloud chega então à conclusão de que a melhor definição possível para designarmos as histórias em quadrinhos seria a de: “imagens pictóricas e outras justapostas em seqüência deliberada destinadas a transmitir informações e/ou a produzir uma resposta no espectador”.

Produção de Sentido
Como vimos, a linguagem quadrinística é única, composta de diversas particularidades e união de diferentes sistemas de signos e demais elementos – com funções e características próprias - que são lidos em conjunto de forma seqüencial. Sendo assim, podemos afirmar que essa linguagem forma “um complexo: um mosaico de códigos que tem como base informações visuais que fundamentam seus signos, mas também são estranhos a este” (Srbek, 2005, p. 31). Entendido desse modo, é possível concluir que o sentido completo de uma narrativa quadrinística somente se produziria na leitura do “todo articulado”. Uma página ou um quadrinho seriam apenas um fragmento desse “todo articulado” , exceto no caso da história possuir início, meio e fim no espaço de apenas uma página, pois, nesse caso, a página não seria um fragmento, mas a história em sua completude.

Tal significação se dará, desse modo, no interior da compreensão do “todo articulado” complexo que é a narrativa das histórias em quadrinhos conjuntamente a um processo de memória, entendido como “uma reconstrução psíquica e intelectual” (Rousso, 2000, P. 94) por parte do indivíduo sempre no interior de um contexto sócio-cultural. Como atesta Geertz (1997, p. 148), uma linguagem não pode ser entendida como “uma lista de variações sintáticas” e, conseqüentemente, qualquer forma artística e estética,  se assim considerarmos as histórias em quadrinhos,  também não pode ser considerada “um mero encadeamento de formas puras”.

Vista a complexidade das histórias em quadrinhos no que tange à sua produção de sentido e compreendendo-as como um produto social da contemporaneidade podemos afirmar que elas são um gênero discursivo secundário que encerra todas as características inerentes a essa categoria de gênero no sentido bakhtiniano.  Ao entendermos a linguagem quadrinística como um gênero secundário do discurso, compreendemos que elas se constroem a partir tanto de uma memória de gênero, que armazena as características que viabilizam a construção de sentidos, quanto de uma memória discursiva, que toma por base o processo de criação de seus enunciados e, ao construí-los, contribuirá para a geração dos enunciados posteriores, bem como de sua construção de sentido.

Desse modo, todo discurso quadrinístico estará sempre intrinsecamente ligado às características que compõem seu gênero e sua memória. Essas características podem, de forma gradativa, sofrer alterações com o passar do tempo, porém sempre dentro de um contexto estritamente social, uma vez que o gênero discursivo é um produto e um produtor do mundo social e suas relações.  Ao assumirmos a linguagem quadrinística como um gênero discursivo secundário compreendemos que a relação gênero/memória de gênero exerce um papel fundamental na produção de sentido e atua como um elemento que facilita a transmissão informacional.

Visto assim, os enunciados que constituem o “todo complexo” de linguagens, signos e demais elementos que caracterizam o gênero quadrinístico demandarão, por parte do sujeito, uma série de informações prévias acerca do gênero discursivo em foco que viabilizarão a construção de sentido e posterior assimilação e produção de informação, sendo um meio passível de produzir conhecimento.

Conclusão
Compreendendo as histórias em quadrinhos como uma manifestação sócio/cultural contemporânea e como o campo de estudo da Ciência da Informação abrange o estudo da questão informacional nas mais variadas linguagens e manifestações humanas, acreditamos que uma maior compreensão da linguagem é de relevância para esse campo de estudo.

Desse modo, trabalharmos com a criação de sentindo na linguagem é trabalhar para termos um maior conhecimento de como funciona uma das linguagens contemporâneas mais utilizadas e difundidas em todo o mundo pelo homem como um meio de manifestar seus pensamentos, suas crenças, sua cultura e seus valores. Visando aos mais diversos propósitos.
 

 

 

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Sobre os autores / About the Authors:

Robson Santos Costa
robson.sc2001@gmail.com

Mestre em Memória Social (PPGMS / UNIRIO.

 

Evelyn Goyannes Dill Orrico
evelynorrico@unirio.br

Doutora em Ciência da informação (IBICT / UFRJ); Pesquisadora do CNPq; Professora Adjunta IV (PPGMS / UNIRIO).



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