Monday, May 12, 2008

Web Arte

Itaú Cultural / revista / www.arte
Por Thiago Rosenberg

Contemplar. Explorar. Interagir. Entreter-se. Perder-se. Incomodar-se. Deparar-se com uma obra de web art é estar sujeito a tudo isso - e muito mais. Mas, afinal, o que é web art?

Uma coisa é certa: não é a arte que se encontra na internet, é a arte feita para a internet. O artista da web, ou web-artista, não é aquele que se apropria da vastidão da rede para divulgar seus trabalhos, mas, sim, aquele que, consciente do potencial artístico do meio, o utiliza criativa e poeticamente. Usa a internet como o pintor usa a tela, como o cineasta usa a câmera.

Artista multimídia e professor do Departamento de Artes Plásticas da Escola de Comunicação e Artes da Universidade de São Paulo (ECA/USP), Gilbertto Prado evidencia essa diferença ao definir dois grupos distintos de sites de arte da world wide web: os sites de divulgação e os sites de realização de eventos ou trabalhos artísticos. Enquanto no primeiro grupo existem primordialmente referências a espaços expositivos ou obras concebidos originalmente para outros meios que não a internet - caso de páginas de museus ou de galerias -, no segundo há sites que se apresentam como a própria obra, concebida para a rede e inexistente sem ela - e é aí que se enquadra a web art.

O meio como mensagem
As linguagens, as ferramentas e os processos que caracterizam a internet são muitas vezes o mote dessas obras. São trabalhos auto-referenciais, metalingüísticos, que pensam criticamente o meio em que se inserem. Questionam, problematizam a internet. De acordo com Prado, "o desvio poético que o artista faz do meio: eis o centro da questão".

A navegabilidade na internet é um desses pontos questionados. Navegar é possível, mas nem sempre é necessário. "O meio possibilita a interação", diz Prado, "mas às vezes interessa mais ao artista torná-lo não-interativo, ou ao menos dificultar essa interação".

Riot, de Mark Napier: a navegabilidade da internet em questão | imagem: Screen shot da obra Riot, de Mark Napier

Projetos da dupla Jodi, formada pela holandesa Joan Heemskerk e pelo belga Dirk Paesmans, são exemplos clássicos. Em www.jodi.org, de 1995, os artistas transformam a linguagem de programação em linguagem artística, saturando as páginas do site com códigos que, para um visitante não inteirado do assunto, podem sugerir uma pane ou um vírus no sistema. Caso semelhante é o trabalho Riot, de 2000, com o qual o canadense Mark Napier propõe um navegador alternativo que, misturando em uma única janela textos, imagens e links de diversos sites, impede o usuário de prosseguir sua navegação.

Ao problematizar o meio, essas obras também problematizam o comportamento do usuário da web. O alemão Holger Friese, com Antworten, desenvolvido em parceria com Max Kossatz em 1997, faz esse usuário aguardar por uma chamada que nunca será feita. Os que acessam o site recebem um número de chamada, mas o número que está sendo atendido no momento não é em momento algum atualizado. Resta então a espera - sem fim - por uma conclusão. Já em Unendlich, fast..., de 1995, Friese coloca em pauta a dificuldade que o usuário pode ter para encontrar algo na imensidão da rede. É uma enorme página azul, com barras de rolagem na vertical e na horizontal, sem textos, sem links, sem nada - com exceção de alguns poucos caracteres isolados num canto da página, pequenas linhas e estrelas perdidas no espaço vazio.

Essa subversão do meio torna clara a diferença entre o web-artista e o webdesigner. Salvo exceções, podemos dizer que existe, por parte do segundo, uma preocupação em transmitir mensagens da maneira mais clara e direta possível, o que nem sempre ocorre com os artistas da web, mais preocupados em quebrar as expectativas do usuário.

Em contato com as outras artes
Não só da web trata a web art. Menos metalingüísticas, algumas obras se valem das possibilidades oferecidas pelo meio para propor narrativas ou discussões sobre as mais diversas questões. E, para tal, muitas vezes bebem nas fontes das outras expressões artísticas, como a literatura.

É o que ocorre, por exemplo, em Aleer - Antilogia Laboríntica, trabalho de 1997 do brasileiro André Vallias, designer gráfico, poeta e produtor de mídias interativas. Sua matéria-prima é a literatura, mas essa é rearranjada para a rede. Assim, textos de vários autores - de Edgar Allan Poe (1809-1849) a Charles Baudelaire (1821-1867) - e poemas visuais do próprio Vallias são distribuídos em um labirinto virtual, repleto de links ocultos. Essa transposição da literatura para o meio virtual é mais explorada em O Livro Depois do Livro, espécie de biblioteca de obras de ciberliteratura idealizada por Giselle Beiguelman, artista da web e professora de pós-graduação em comunicação e semiótica da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC/SP).

O espaço virtual artístico
Contemplar uma obra de web art é uma experiência solitária? Em termos. Os apreciadores de cinema se reúnem nas salas de projeção; os que gostam de música ou de teatro se encontram nos espetáculos; os admiradores das artes plásticas se vêem nos museus. Para cada arte há o seu templo. No caso da web art, esse espaço não é físico, mas, se o artista assim quiser, existe.

Desertesejo, trabalho realizado em 1999 por Gilbertto Prado, permite que seus fruidores se encontrem na paisagem onírica criada pelo artista. O contato se dá por meio de avatares [representações virtuais do usuário], como ocorre, por exemplo, no Second Life - espécie de mundo virtual em três dimensões, aberto ao público desde 2003 e acessível pelo site http://secondlife.com. Mas as semelhanças entre esse serviço e obras como Desertesejo acabam por aí. "São propostas diferentes", diz Prado. "O Second Life é bem mais voltado à comunicação social, não é um 'projeto artístico'."

Presente em importantes mostras internacionais, como a Bienal de São Paulo e a Documenta de Kassel (na Alemanha), a web art parece extrapolar o espaço virtual e reunir - fisicamente - uma grande parcela do público interessado em artes. De acordo com Prado, esse crescente interesse pela arte da web se deve, principalmente, à sua extrema contemporaneidade. "É uma manifestação artística eminentemente contemporânea", diz ele. "Tanto no que diz respeito ao meio - intrínseco à vida contemporânea - quanto ao conteúdo."

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